quarta-feira, 20 de maio de 2009

TEATRO DE AMADORES DE PERNAMBUCO E TEATRO VALDEMAR DE OLIVEIRA


TEATRO DE AMADORES DE PERNAMBUCO E TEATRO VALDEMAR DE OLIVEIRA

Semira Adler Vainsencher
semiraadler@gmail.com
Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco

O surgimento do Teatro Valdemar de Oliveira se confunde com a própria estória do Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP). Neste sentido, fica muito difícil falar de um, sem falar do outro. Sem sombra de dúvidas, o TAP foi uma criação do médico Valdemar de Oliveira, surgindo por acaso.

Como é que tudo isso aconteceu?

Primeiramente, o teatrólogo Samuel Campelo criou o Grupo Gente Nossa, em 2 de agosto de 1931. O Grupo foi fundado no Teatro Santa Isabel, e estreou no Recife com a peça A Honra da Tia, de sua autoria, que fez um grande sucesso. O Grupo Gente Nossa, por outro lado, estava sob a responsabilidade do Teatro Infantil, cuja primeira peça encenada foi A Princesa Rosalinda, em 26 de março de 1939. Ela foi dirigida pelo seu próprio autor, Valdemar de Oliveira.

Aproximadamente dois anos depois do surgimento do Teatro Infantil, por ocasião do centenário da Sociedade Pernambucana de Medicina, Otávio Freitas - o então presidente da entidade - chamou o médico e amigo, Valdemar de Oliveira, para uma conversa reservada: ele desejava criar uma atividade cultural para comemorar a importante data. Este último resolveu ousar e sugeriu a montagem de uma peça teatral. O presidente da entidade indagou, então, se ele não tinha se tornado insano. O médico Valdemar de Oliveira, porém, não titubeou um segundo sequer: reuniu a própria família e os amigos e encenou a peça Dr. Knock, escrita pelo francês Jules Romains.

Na época, um dos seus maiores desafios foi o combate ao preconceito. Isto porque atores e atrizes não eram bem vistos pela sociedade. Os primeiros, não tinham classificação social e, as segundas, eram consideradas como possuidoras de comportamento suspeito. Na primeira metade do século XX, ninguém aceitava que uma mulher entrasse em cena. Tampouco as representantes do sexo feminino ingressavam em universidades e trabalhavam fora do lar. E, para piorar as coisas, o teatro era considerado como uma arte baixa. Mesmo diante dessas circunstâncias, Valdemar de Oliveira jamais se intimidou: decidiu convocar somente os médicos e as suas respectivas esposas para integrar o elenco do espetáculo que se propunha a montar.

A peça Dr. Knock obtém um grande êxito artístico, social e financeiro. Dessa maneira, estava formado o Teatro de Amadores de Pernambuco, grupo que foi forjado e moldado nos ideais de Samuel Campelo, ídolo maior de Valdemar de Oliveira. A primeira plaqueta oficial do TAP, porém, datou de 4 de abril de 1941. Somente a partir daí, então, o grupo ganhou status cultural no Recife.

O TAP ficou constituído como um departamento do Grupo Gente Nossa, mas independente no que diz respeito ao elenco profissional. Mais uma vez: foi a admiração pela competência e pelo idealismo de Samuel Campelo o que fez Valdemar de Oliveira criar o Teatro de Amadores. E, desde a sua fundação, há mais de sessenta anos, já atuou no grupo, como artistas amadores, um número superior a oitocentos (800) atores e atrizes.

Em se tratando dos diretores artísticos e musicais do TAP, desde a sua criação, existe a seguinte lista por ordem alfabética: Adacto Filho, Alfredo de Oliveira, Adhelmar de Oliveira Sobrinho, Bibi Ferreira, Clenio Wanderley, Clóvis Pereira, Fernando de Oliveira, Flamínio Bollini Cerri, Geninha Sá da Rosa Borges, Graça Melo, Guedes Peixoto, Hermilo Borba Filho, Luciana Lyra, Luís de Lima, Jorge Kossowski, Milton Baccarelli, Nelson Ferreira, Raul Antônio, Reinaldo de Oliveira, Renato Phaelante, Ricardo Mourão, Rogério Costa, Valdemar de Oliveira, Valter de Oliveira, Vanda Phaelante, Willy Keler, Zbignief Ziembinski e Zigmunt Turkof.

O Teatro Valdemar de Oliveira, por sua vez, está localizado na Praça Osvaldo Cruz número 412, no bairro da Boa Vista, defronte da Sociedade Pernambucana de Medicina. Foi construído pela família Oliveira, possui quatrocentos (400) lugares e foi chamado, inicialmente, de Nosso Teatro. No salão do teatro nobre podem ser apreciadas duas telas de Murillo La Greca: um retrato do Conde da Boa Vista e um outro do engenheiro Louis Vauthier.

Em 23 de maio de 1971, o Teatro de Amadores passou a chamar o Nosso Teatro de Teatro Valdemar de Oliveira, como uma justa homenagem ao seu fundador. Além de médico e professor, Valdemar de Oliveira foi ainda advogado, higienista, musicólogo, escritor, diretor e crítico de arte.

Até hoje, o Teatro Valdemar de Oliveira mantém uma estrutura do tipo familiar. Nele, o ator não é tratado como um artifício em cena, mas como uma parte relevante do grupo. O trabalho do elenco, por sua vez, continua sendo filantrópico: todo o capital financeiro, depois de tiradas as despesas de custeio da montagem e o pagamento do pessoal fixo - secretárias, contra-regras, arquivo - é revertida para várias entidades sem fins lucrativos.

Dito de outra maneira, a receita do TAP (o seu lucro), em qualquer espetáculo que faça, conforme estabelecido no próprio estatuto, é destinada a auxiliar uma série de associações de caráter social, inclusive em vários Estados do País, tais como educandários, asilos, leprosários, cruzadas de ação social, institutos de proteção e assistência à infância, entre outras. No Recife, por exemplo, a renda do Teatro de Amadores vai para a Maternidade do Hospital Pedro II, a Sociedade de Medicina, o Abrigo Cristo Redentor, o Instituto dos Cegos e a Caixa Escolar da Escola Normal Pinto Júnior.

Embora não seja regra geral, os risos da platéia indicam que muitas dos espetáculos apresentados pelo TAP tendem a ser do tipo comédia, bem como regionalistas. Neste sentido, é importante registrar que a peça Um sábado em trinta, de Luiz Marinho, ficou vinte e nove (29) anos em cartaz. E que a peça Está lá fora um inspetor, de autoria do escritor inglês J. B. Priestley, obteve o maior número de apresentações.

O Teatro de Amadores de Pernambuco já construiu um teatro próprio, realizou cinqüenta e quatro (54) excursões, em mais de vinte e oito (28) cidades do Brasil, encenou cento e dez (110) originais, beneficiando mais de cem (100) instituições sociais. Em 1953, levou para o Rio de Janeiro, inclusive, as peças A Casa de Bernarda Alba, de Garcia Lorca, Sangue Velho, de Aristóteles Soares e Valdemar de Oliveira, e Esquina Perigosa, de J. B. Priestley. E, além desses autores, encenou obras de Molière, Tennessee Williams, Thornton Wilder, Arthur Miller, Oscar Wilde, Eugene O'Neill e Dias Gomes.

Moldado através do idealismo, o Teatro de Amadores de Pernambuco e o Teatro Valdemar de Oliveira representam marcos de suma relevância no Estado e no País, sendo respeitados por todos aqueles que amam o teatro. O TAP, por um lado, foi engendrado através de caráter revolucionário; e o Teatro Valdemar de Oliveira, por outro, é filho legítimo daquele.

Ainda insistindo em sobreviver dos ecos do passado, mantendo o estilo peculiar, os fins não lucrativos, o espírito de família, ambos conseguiram, definitivamente, um lugar na História do Brasil. O palco, por fim, para os artistas amadores do Estado, não significa apenas uma arena, um mero local de trabalho: continua sendo, tal qual bandeira desfraldada, a fonte dos seus maiores sonhos. E o Teatro Valdemar de Oliveira, abraçando a todos, a sua própria morada.

Fontes consultadas:

FRANCA, Rubem. Monumentos do Recife: estátuas e bustos, igrejas e prédios, placas e inscrições históricas do Recife. Recife: Secretaria de Educação e Cultura, 1977.

FUNDAÇÃO de Cultura Cidade do Recife: teatros. Disponível em http://www.recife.pe.gov.br/pr/seccultura/fccr/teatros.php. Acesso em: 11 nov. 2002.

SANTA CRUZ, Angélica; BENFICA, Miguel. O sucesso do TAP parece ser eterno. Veja. São Paulo, n.29, p. 6-8, jul. 1992.

OLIVEIRA, Valdemar. Teatro de Amadores de Pernambuco. Disponível em http://www.tap.org.br. Acesso em: 20 nov. 2002.

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